sábado, 12 de setembro de 2009

Caio Fernando Abreu


“Se eu não fosse escritor eu seria jardineiro.”

Caio Fernando Abreu - (12/09/1948 - 25/02/1996)






Se estivesse entre nós, Caio faria hoje 61 anos.

Dono de um grande talento para escrita, foi jornalista, contista e um dos melhores escritores de cartas da literatura brasileira.

Intenso, atrevido, excêntrico... Profundo.

Ler a obra de Caio Fernando Abreu é como perpetuar pelo íntimo, pelo âmago de seus personagens. E descobrir que talvez 2 + 2 não são exatamente 4. Sua escrita tem traço forte, seus personagens vertem sangue, se alimentam de risos, lágrimas, mágoas, cigarros, orgasmos e muitas vezes solidão.
Seus contos são repletos de expressões faciais, suspiros, gritos e gemidos... Gente dizendo adeus, gente se reencontrando.
"De todos aqueles dias seguintes, só guardei três gostos na
boca - de vodca, de lágrima e de café."

Assim era o gaúcho Caio Fernando Abreu, natural da pequenina Santiago no interior do RS, mas que tinha o mundo escondido na palma de sua mão. Amava Paris, Londres e principalmente Berlim, o centro do mundo na visão dele.
"Quando você não tem amor,você ainda tem as estradas."

Urbano, moderno, antigo, contemporâneo... Tudo cabia na obra de Caio e tudo fazia sentido. Junto ou separado.

Seu talento rompeu fronteiras, seus livros foram traduzidos para vários idiomas. Ganhou prêmios literários. Viveu intensamente os loucos anos 70 na imensa São Paulo. Curtiu a juventude... Até o dia 25/02/1996 quando perdeu sua batalha contra o vírus do HIV.
"Venha quando quiser, ligue, chame, escreva - tem espaço na casa e no
coração,só não se perca de mim."
"Não é verdade que as pessoas se repetem. O que se repetem são as situações."

Fui apresentada a obra do Caio quando li o conto Para uma Avenca Partindo, do livro Morangos Mofados, que ao meu ver é a melhor obra dele.
Segue um trecho:

"...eu me perguntava até que ponto você era aquilo que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você, eu queria saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu sentia, e se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas as coisas que me fascinavam e que no fundo, sempre no fundo, talvez nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só conseguir ver, e dasamar era não mais conseguir ver..."


Gostei tanto do conto que li o resto do livro e gostei tanto do livro que o comprei depois, e gostei tanto que li outros contos, outros livros e comprei outros também.

Para mim, a obra de Caio sempre remete a imagem "reconstrutiva" do outono. Silêncio. Praças públicas em dias nublados. Estradas molhadas pela chuva. Pontos singulares e minúsculos de uma conversa ou de um movimento qualquer. Rosas deixadas nas janelas e cartas... Sim muitas cartas...

"Nunca mais o amor era o que mais lhe doía, e de todas as dores, a única que ele jamais confessaria."





Uma excelente passagem do conto Harriet, do Livro Os Dragões não Conhecem o Paraíso:

"Sabe que o meu gostar por você chegou a ser amor pois se eu me comovia vendo você pois se eu acordava no meio da noite só pra ver você dormindo meu deus como você me doía vezenquando eu vou ficar esperando você numa tarde cinzenta de inverno bem no meio duma praça então os meus braços não vão ser suficientes para abraçar você e a minha voz vai querer dizer tanta mas tanta coisa que eu vou ficar calada um tempo enorme só olhando olhando e pensando meu deus ah meus como você me dói vezenquando"


Sempre que ensaio alguma escrita me inspiro nele, e se pudesse escolher, escolheria poder escrever como ele. Não porque invejo o talento que ele teve e eu não, mas porque tenho imensa admiração por sua escrita e admira-lo é como ser impelida para o infinito e de lá trazer toda a sabedoria possível.
"Não adianta,não sei explicar . As palavras traem o que a gente sente."
Caio, sem você o alfabeto seria um instrumento mudo. Obrigada por ter existido.

Obras:
Inventário do irremediável (contos) - 1970.
Limite branco, (romance) - 1971.
O ovo apunhalado, (contos) - 1975
Pedras de Calcutá, (contos) - 1977
Morangos mofados, (contos) -1982
Triângulo das águas (novela) - 1983
As frangas, ( novela infanto-juvenil) - 1988.
Os dragões não conhecem o paraíso, ( contos) - 1988.
A maldição do Vale Negro,(peça teatral) - 1988.
Onde andará Dulce Veiga?, (romance) - 1990.
Ovelhas negras, (contos) - 1995.
Mel & girassóis, antologia.
Estranhos estrangeiros, (contos) - 1996.
Pequenas Epifanias, ( crônicas) - 1986/1995
Teatro completo, 1997
Cartas, correspondência. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2002 (organização de Ítalo Moriconi).

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